segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

A primeira vez a gente não esquece

A ideia de criar um blog é antiga, mas até então estava faltando um fator motivador.
Eis que estou em plena sexta à tarde, sonhando com a chegada do fim de semana, quando abrem a porta:

- Homicídio no Riacho Fundo, quem vai??

Olhei para os lados, na agonia de não me escolherem com a ânsia de ter de enfrentar pela primeira vez algo que, infelizmente, fará parte da minha rotina, e disse:

- Eu vou. Hoje é o meu dia de ronda policial mesmo...

E fui.
Chegando lá, após pegar trânsito e chuva, que faziam o coração disparar cada vez mais, logo avistamos um carro da polícia e umas cem pessoas olhando o homem baleado no chão. O que será que as pessoas veem de tão interessante? O que eu menos queria era olhar! Mas mesmo assim, pessoas de todas as idades, sexo e classe social ficavam lá, apenas olhando. Os olhos não demonstravam dor, nojo, medo e tampouco pena. Apenas olhavam. Que coisa...

Enfim, desci do carro e fui correndo ao local do crime. Conversei com as pessoas que estavam lá, depois fui à administração da pequena cidade, conversar com mais fontes, e segui rapidamente para a delegacia.

Lá estavam mais dois jornalistas, e nessa hora me senti super gente grande, realizando o sonho de cobrir a minha primeira pauta. Quando apareceu o delegado, então, me senti uma profissional. Mas creio que o meu gaguejar e o olhar certamente esbugalhado denunciavam a minha total inexperiência naquilo.
Conversar com o delegado foi tranquilo. Consegui acompanhar o ritmo da mini coletiva e até fazer umas perguntas.

Difícil mesmo foi conversar com a esposa da vítima. Não sabia como abordá-la. A vontade era de dar um abraço e dizer que sentia muito, mas tinha que manter o profissionalismo. Ao mesmo tempo tinha vontade de ir embora sem falar com ela. Que invasão de privacidade tentar arrancar informações de quem acabou de se tornar viúva!

Mas o jornalismo falou mais alto e eu fui, junto com os outros jornalistas.
Nela eu vi o olhar que esperava encontrar. As lágrimas, travadas pela dor, não desciam. A voz, rouca, não ecoava o grito que deveria explodir dentro dela. O único consolo era o cigarro, que logo tragaria em breves puxadas.

Trabalho feito, voltei pra redação, escrevi e fui embora.

Tentava disfarçar que o estômago embrulhado era fome, e que os olhos cheios de lágrima eram sono. Mas, como quem não chora, não mama, eu continuo na ralação. Torcendo, embora seja inevitável, para que aquele dia não se repita tão cedo.

Link da matéria: http://migre.me/hAcH